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Canal do Varadouro

- Tamara

Eucaliptos, araucárias, ingás, coqueiros e, por fim, pisamos na restinga, descalças. Dobramos a barra da calça e entramos no mar de São Francisco do Sul (SC).

Fomos para ver o Museu Nacional do Mar. Em uma crise de gestão, o museu anda hoje escondido, mas guarda uma das mais importantes coleções de embarcações tradicionais do mundo. Um pouco triste ver, coberto de pó, um conjunto de obras lindíssimo, produzido por gente que dedica a vida à arte de fazer canoas.

Estava de baixo da poeira o maior aprendizado da viagem.

Ficamos hospedados na casa de amigos de Joinville. O Rogério nos levou pra passear pela Baía da Babitonga. Quase um Vigílio que Dante inventou pra conhecer as esferas da vida após a morte, ele nos mostrou o que conhece e sabe do lugar onde mora, enquanto passemos por lá. Navegamos em canais pouco conhecidos, procuramos guarás, acompanhamos bateiras de pesca, tomamos banho de mar; em todos os lugares, alguém conhecia nosso condutor, em todos os lugares, sofríamos de dor na barriga de tanto rir das histórias dele. “Estar aqui é como estar no Paraíso”, achei que o Rogério falava da paisagem, era bonita mesmo.

Fui com o primo dele pescar camarão. Jogamos a rede na água e, em pouco, tempo senti as puxadinhas dos crustáceos. Ao subir a rede, me assustei com o bagre que veio junto, e corri pra devolvê-lo vivo. Passamos perto de barcos pesqueiros maiores; todas as proporções da nossa bateira eram multiplicadas: ao invés de braços humanos, duas hastes de 5m saiam do barco perpendicularmente, e estendiam a enorme rede na água com a ajuda de peças de chumbo. Ao invés de pequenos peixes pegos por engano, os barcos arrastavam um volume de sedimentos e outros animais muito superior à porção de camarões que interessava. Esses mesmos pescadores, por outro lado, sofrem com pagamentos baixos que, de certa forma, acabam estimulando essa atividade predatória.

A Marininha reclamava de fome. Respondendo que já estávamos “mais perto que longe” de casa, Rogério nos levou para comprar ostras. O vendedor fazia questão de não apenas vender, mas dar uma palestra sobre produção e preparação dos moluscos que oferecia. Foi assim que o vício do meu pai, e do vendedor, contaminou o resto da nossa família, e passamos a construir nosso sambaqui* particular com as conchas vazias.

O passeio de barco foi quase uma Divina Comédia. Conheci o purgatório de quem sofre com a profissão e, por consequência, me leva a fugir do que produzem. Por outro lado, percebi que estar cercada de gente que ama o que faz, é mesmo a melhor forma de estar ,pelo menos, “mais perto que longe”, do paraíso.

*  sambaqui – um amontoado de conchas, ossos, cerâmica, entre outros, feito por povos litorâneos na Pré-História do Brasil

  • Eram muitas as bateiras de pesca

  • As baleeiras pesqueiras têm grandes redes de arrasto

  • Os biguás faziam uma coreografia sobre os pescadores

  • Chegávamos perto dos grandes navios que saíam de Itajaí e São Fco. do Sul

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